A decisão da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe um importante precedente jurídico ao definir que não incide Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre a mera transferência de cotas de fundo de investimento para herdeiros em casos de sucessão causa mortis, quando não ocorre resgate ou alienação das cotas.
Essa decisão, baseada no princípio da legalidade tributária, esclarece os limites da incidência do IRRF em situações envolvendo heranças e fundos de investimento, destacando que o tributo só será devido caso a transferência seja feita pelo valor de mercado e com apuração de ganho de capital.
Transferência de Cotas de Fundo de Investimento: Contexto do Caso
Dois irmãos ingressaram com mandado de segurança preventivo para evitar a cobrança de IRRF na transferência de cotas de fundo de investimento herdadas do pai. Após o falecimento do titular das cotas, os herdeiros solicitaram a transferência dos ativos conforme o valor declarado na última declaração de Imposto de Renda do falecido.
No entanto, o banco responsável pela administração do fundo informou que haveria a incidência do IRRF sobre essa operação, justificando que a transferência configuraria uma alteração escritural passível de tributação.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) chegou a decidir que a transferência implicaria tributação, mas os herdeiros recorreram ao STJ, que proferiu decisão favorável a eles.
Entendimento do STJ sobre a Incidência de IR na Herança
O relator do caso, ministro Gurgel de Faria, enfatizou que não há fato gerador do IRRF em situações de transferência causa mortis, desde que:
- As cotas sejam avaliadas pelo valor constante na última declaração do falecido, e não pelo valor de mercado.
- Não haja resgate, alienação ou liquidação das cotas durante o processo de transferência.
Conforme previsto no artigo 23 da Lei 9.532/1997, os herdeiros podem optar por avaliar os bens transferidos pelo valor de mercado ou pelo valor declarado no Imposto de Renda do falecido. No caso em questão, como não houve alteração do valor declarado e os herdeiros optaram por manter as cotas sob administração, o STJ considerou que não há base legal para a tributação.
Análise da Legalidade Tributária pelo STJ
O ministro Gurgel de Faria destacou a importância do princípio da legalidade tributária no direito brasileiro. Segundo o artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, nenhum tributo pode ser exigido ou aumentado sem previsão em lei.
O relator pontuou que a Receita Federal não pode interpretar amplamente normas que determinam a incidência de tributos. No caso analisado, não existe na legislação tributária nenhuma disposição específica que autorize a cobrança do IRRF em transferências causa mortis de cotas de fundos de investimento, desde que respeitadas as condições estabelecidas.
Quando o IR Pode Incidir na Transferência de Cotas de Fundo de Investimento?
O STJ deixou claro que a cobrança de IRRF é legítima apenas em casos específicos, como:
Situação | Incidência de IRRF? |
---|---|
Transferência por valor constante na declaração do falecido | Não |
Transferência por valor de mercado com ganho de capital | Sim |
Resgate, liquidação ou alienação das cotas | Sim |
Portanto, no contexto de heranças, a tributação só será aplicável caso a transferência seja feita com base no valor de mercado e resulte em diferença positiva em relação ao valor de aquisição das cotas, caracterizando ganho de capital.
Impactos da Decisão do STJ
A decisão reforça a necessidade de respeito às normas legais em matéria tributária, protegendo os contribuintes contra cobranças indevidas. Além disso, o posicionamento da Primeira Turma cria um precedente importante, que:
- Evita interpretações abusivas por parte da Receita Federal.
- Oferece maior segurança jurídica aos herdeiros.
- Restringe a cobrança de IRRF apenas às situações previstas em lei.
Aspectos Técnicos da Decisão
Artigos de Lei Aplicados
- Lei 9.532/1997, artigo 23: Prevê opções de avaliação de bens e direitos transferidos em heranças.
- Lei 8.981/1995, artigo 65: Trata da incidência do IRRF em rendimentos de aplicações financeiras, mas não se aplica a transferências causa mortis.
Princípios Constitucionais
- Princípio da Legalidade Tributária (CF, art. 150, I): Proíbe exigências tributárias sem previsão legal específica.
Fato Gerador
O fato gerador do IRRF ocorre apenas quando há ganho de capital na transferência ou movimentação de cotas, o que não aconteceu no caso analisado.
Perguntas Frequentes sobre IR em Heranças
1. É obrigatório pagar IRRF em heranças?
Não, o IRRF não incide automaticamente sobre heranças. Depende do tipo de bem transferido e das condições da transferência, como avaliação pelo valor de mercado com ganho de capital.
2. A transferência de cotas de fundo sempre gera IR?
Não. Se a transferência for realizada pelo valor constante na última declaração do falecido e sem resgate ou alienação, não há incidência de IRRF.
3. O que fazer caso o banco ou a Receita Federal exija o IR indevidamente?
Os herdeiros podem ingressar com um mandado de segurança para evitar a cobrança indevida, utilizando como base a decisão do STJ.
Conclusão
A decisão da Primeira Turma do STJ de afastar a cobrança de IRRF na transferência de cotas de fundo de investimento por herança é um marco relevante no direito tributário brasileiro. O julgamento esclarece que a mera atualização cadastral das cotas no nome dos herdeiros não configura fato gerador do imposto, desde que respeitadas as condições previstas em lei.
Este entendimento reforça a proteção aos contribuintes contra cobranças tributárias arbitrárias, reafirmando o princípio da legalidade e oferecendo maior segurança jurídica em casos de sucessão causa mortis.