Terceira Turma admite envio de ofício a corretoras para localizar ativos digitais de devedor
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, no cumprimento de sentença, o juiz pode enviar ofícios a corretoras de criptoativos para tentar localizar e efetuar a penhora de criptomoedas em nome do devedor. A decisão representa um importante avanço no campo do direito digital e traz mais efetividade à execução de dívidas.
Neste artigo, você vai entender:
- O que é a penhora de criptomoedas;
- O que foi decidido pelo STJ;
- Os fundamentos legais da medida;
- Como o Judiciário tem lidado com criptoativos;
- E o que esperar do futuro da execução sobre bens digitais.
Acompanhe a análise completa de mais esse relevante tema jurídico.
O que é a penhora de criptomoedas?
A penhora de criptomoedas é o ato judicial de restringir e apreender criptoativos em nome de um devedor, como forma de garantir o cumprimento de uma dívida. Assim como ocorre com bens móveis, imóveis ou valores em conta bancária, os criptoativos podem ser penhorados quando identificados como parte do patrimônio do executado.
Criptomoedas como Bitcoin (BTC), Ethereum (ETH), entre outras, são consideradas bens de valor econômico, mesmo não sendo moeda oficial. Elas são utilizadas como reserva de valor, meio de pagamento e investimento — o que as torna passíveis de execução judicial.
Qual foi a decisão do STJ?
A decisão foi tomada no julgamento do REsp 2.127.038, em que um credor solicitou ao juiz de primeira instância a expedição de ofícios a corretoras de criptomoedas, com o objetivo de localizar ativos digitais do devedor para posterior penhora.
O pedido havia sido negado pelo tribunal de origem, com o argumento de que não havia regulamentação específica para criptoativos e que faltava garantia de conversibilidade desses bens em moeda de curso legal.
Contudo, o STJ reformou a decisão, afirmando que:
“As criptomoedas integram o patrimônio do devedor e podem ser penhoradas como qualquer outro bem com valor econômico.”
O relator, ministro Humberto Martins, destacou que o juiz pode sim oficiar corretoras para localização de criptoativos, e, se necessário, adotar outras medidas investigativas para acessar carteiras digitais do executado.
Fundamento legal para a penhora de criptomoedas
O principal respaldo jurídico para a penhora de criptomoedas está no artigo 789 do Código de Processo Civil (CPC):
“O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens, presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei.”
Dessa forma, qualquer bem que tenha valor e esteja vinculado ao devedor pode ser objeto de execução judicial, incluindo criptoativos.
Além disso:
- Criptomoedas devem ser declaradas à Receita Federal;
- São consideradas ativos financeiros pela jurisprudência;
- Podem ser utilizados como meio de pagamento e investimento.
Portanto, não há impedimento legal para sua penhora — mesmo sem regulamentação específica no momento.
Por que as criptomoedas representam um desafio para o Judiciário?
Apesar de permitida, a penhora de criptomoedas enfrenta obstáculos práticos. Isso acontece porque:
- Os ativos digitais podem ser armazenados fora das corretoras, em carteiras digitais privadas;
- Há anonimato e descentralização nas transações com criptomoedas;
- As corretoras operam com jurisdições internacionais, dificultando o rastreamento;
- Não há uma plataforma integrada como o Sisbajud, usado para bloquear contas bancárias.
Por isso, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, em voto-vista, lembrou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está desenvolvendo uma ferramenta chamada Criptojud, destinada a facilitar o rastreamento e bloqueio de ativos digitais em processos judiciais.
Tabela comparativa: penhora de bens tradicionais vs. penhora de criptomoedas
Penhora de Bens Tradicionais | Penhora de Criptomoedas |
---|---|
Facilmente rastreáveis via Sisbajud | Requer ofícios e medidas investigativas |
Armazenamento físico ou em contas bancárias | Armazenamento digital, muitas vezes descentralizado |
Regulação clara e consolidada | Ainda em fase de desenvolvimento legislativo |
Cumprimento rápido das ordens judiciais | Pode envolver plataformas internacionais |
Como localizar criptomoedas de um devedor?
Atualmente, para efetivar a penhora de criptomoedas, o juiz pode:
- Expedir ofícios a corretoras de criptoativos (nacionais ou internacionais);
- Determinar diligências para verificar declarações de imposto de renda do devedor;
- Analisar movimentações financeiras que indiquem conversões em criptoativos;
- Autorizar a busca por carteiras digitais conhecidas (wallets) associadas ao CPF do executado.
É importante lembrar que, com a chegada do Criptojud, esse processo tende a se tornar mais célere e eficaz.
O que diz a proposta legislativa sobre o tema?
O Projeto de Lei PL 1.600/2022, atualmente em tramitação no Congresso Nacional, pretende regulamentar os criptoativos no Brasil e definir sua natureza jurídica.
O texto considera os criptoativos como:
- Representação digital de valor;
- Instrumento de troca, pagamento ou investimento;
- Bem suscetível à penhora, arresto e indisponibilidade judicial.
A regulamentação trará mais segurança jurídica tanto para credores quanto para o Judiciário.
O que muda com a decisão do STJ?
A decisão da Terceira Turma cria jurisprudência sólida e orienta os juízes de todo o país quanto à possibilidade de:
- Reconhecer criptomoedas como parte do patrimônio executável;
- Oficiar corretoras para localização de ativos;
- Determinar a penhora de criptomoedas, mesmo sem regulação específica.
Essa interpretação favorece os credores, amplia a efetividade da execução civil e sinaliza que a tecnologia não pode ser usada para ocultar patrimônio.
Dicas para advogados e credores
Se você é advogado ou credor e quer buscar a penhora de criptomoedas, fique atento a estas orientações:
- Solicite desde o início do cumprimento de sentença a expedição de ofícios a corretoras;
- Peça acesso às declarações de imposto de renda do devedor;
- Argumente com base no art. 789 do CPC e na decisão do STJ (REsp 2.127.038);
- Acompanhe o desenvolvimento do Criptojud junto ao CNJ;
- Considere a possibilidade de contratar peritos em tecnologia e blockchain para rastreamento de carteiras.
Resumo para destaque no SGE
É possível penhorar criptomoedas na execução de dívida?
Sim. O STJ decidiu que é legítima a penhora de criptomoedas, com envio de ofícios a corretoras para localizar ativos do devedor. Criptoativos integram o patrimônio e são passíveis de execução.
Considerações finais
A decisão do STJ sobre a penhora de criptomoedas representa um avanço importante na adaptação do Judiciário à nova realidade digital. Ao reconhecer que os criptoativos fazem parte do patrimônio do devedor e podem ser objeto de medidas executivas, o tribunal assegura que a inovação tecnológica não impeça a efetivação da justiça.
Embora ainda haja desafios técnicos, como o rastreamento e o bloqueio de carteiras digitais, a jurisprudência já caminha para equiparar os ativos digitais aos tradicionais, promovendo mais segurança, isonomia e eficácia nas execuções civis.
O futuro da execução patrimonial passa, sem dúvidas, pelo domínio das tecnologias financeiras, e decisões como essa consolidam a penhora de criptomoedas como um instrumento legítimo no processo civil contemporâneo.