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Repactuação de dívida por superendividamento: STJ limita sanções a bancos

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Entenda o que muda com a decisão que protege instituições que comparecem à audiência, mesmo sem proposta

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que bancos e credores que comparecem à audiência de conciliação na fase de repactuação de dívida por superendividamento, mesmo que não apresentem proposta de acordo, não podem ser automaticamente penalizados com as sanções previstas no artigo 104-A, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

A decisão, da Terceira Turma, traz importantes esclarecimentos sobre a obrigação dos credores em audiências de negociação e o papel do consumidor superendividado na construção do plano de pagamento.

Neste artigo completo, vamos explorar:

  • O que é a repactuação de dívida por superendividamento;
  • O que diz o artigo 104-A do CDC;
  • Como o STJ interpretou as obrigações dos credores;
  • O que muda com essa decisão;
  • E como se preparar para as novas práticas em audiências conciliatórias.

O que é a repactuação de dívida por superendividamento?

A repactuação de dívida por superendividamento é um mecanismo criado para auxiliar consumidores em situação de superendividamento a renegociar suas dívidas de forma coletiva, com todos os credores, e preservar o chamado mínimo existencial.

Ela foi introduzida na legislação pela Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor para incluir medidas de prevenção e tratamento do superendividamento. O objetivo é permitir que o devedor, com boa-fé e sem má intenção, possa organizar sua vida financeira com a ajuda do Judiciário e dos próprios credores.

O processo tem duas fases:

  1. Pré-processual (audiência de conciliação com os credores);
  2. Judicial (caso não haja acordo, o juiz pode determinar a repactuação compulsória).

O que diz o artigo 104-A do CDC?

O artigo 104-A do Código de Defesa do Consumidor trata especificamente da audiência de conciliação na repactuação de dívidas e impõe sanções aos credores que não comparecerem injustificadamente.

Veja o que diz o parágrafo 2º do artigo:

§ 2º O não comparecimento injustificado do credor à audiência de conciliação acarretará:

  • suspensão da exigibilidade do crédito;
  • interrupção dos encargos de mora;
  • sujeição do crédito ao plano compulsório, se este for instaurado.

Essas penalidades têm como objetivo incentivar a participação ativa dos credores no processo de negociação.


O caso julgado pelo STJ

No caso analisado (REsp 2.191.259), um banco foi penalizado por comparecer à audiência, mas não apresentar proposta de acordo. As instâncias inferiores entenderam que isso equivaleria ao não comparecimento, aplicando as sanções previstas no CDC.

Foram impostas medidas como:

  • Suspensão da exigibilidade da dívida;
  • Interrupção dos juros de mora;
  • Inclusão forçada do banco no plano de pagamento.

O banco recorreu ao STJ alegando que sua presença na audiência foi suficiente para afastar as penalidades, mesmo sem proposta de acordo.


O que decidiu o STJ?

A Terceira Turma do STJ, por maioria, acolheu o recurso do banco e entendeu que o simples comparecimento à audiência já cumpre o dever legal do credor. Não se pode exigir, segundo o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que o credor obrigatoriamente apresente uma proposta, pois:

“Como é ônus do devedor a apresentação de proposta conciliatória, ela não pode ser exigida dos credores.”

Segundo o ministro, é o consumidor quem deve apresentar um plano de pagamento viável, e os credores apenas avaliam e decidem se aceitam ou não a proposta.


Quais os fundamentos da decisão?

A decisão do STJ se baseia em três pilares:

1. Princípio da cooperação

A audiência pré-processual deve ser marcada pela cooperação entre as partes, mas isso não significa obrigação de formular propostas, principalmente sem base na realidade financeira do consumidor.

2. Ônus do consumidor

É do devedor o ônus de apresentar um plano de pagamento. O credor pode aceitar, rejeitar ou propor ajustes, mas não está legalmente obrigado a apresentar uma proposta alternativa.

3. Inexistência de sanção sem previsão legal

A aplicação das penalidades do artigo 104-A, § 2º, exige ausência injustificada. Apenas a falta de comparecimento sem justificativa autoriza tais medidas — não a ausência de proposta.


Tabela comparativa: obrigações do credor e do devedor

Consumidor SuperendividadoCredor (Banco ou Financeira)
Deve apresentar plano de pagamentoPode aceitar, recusar ou sugerir ajustes
Comparece à audiência com propostaDeve comparecer, mas não é obrigado a propor
Prova boa-fé e comprometimentoDemonstra abertura ao diálogo ao estar presente
Solicita a repactuação de dívidaAnalisa viabilidade do plano apresentado

O que muda na prática?

A decisão do STJ traz maior segurança jurídica aos credores e evita que sejam penalizados indevidamente por comparecerem à audiência, mas optarem por não propor um acordo imediato.

Para o consumidor, a decisão reforça a necessidade de preparo e organização ao buscar a repactuação de dívida por superendividamento, pois ele deve apresentar uma proposta concreta e viável.

Além disso:

  • Juízes não poderão aplicar sanções automaticamente a credores presentes;
  • Credores passam a ter maior tranquilidade processual;
  • A fase judicial da repactuação continuará sendo uma alternativa caso não haja acordo na audiência.

Qual o papel do juiz na fase judicial?

Se não houver acordo na audiência pré-processual, o juiz poderá:

  • Instaurar a fase judicial da repactuação;
  • Determinar a revisão contratual;
  • Imputar ao credor a repactuação compulsória;
  • Adotar medidas como suspensão da dívida e interrupção dos encargos, desde que haja justificativa cautelar.

Como consumidores e advogados devem agir?

Para consumidores:

  • Organizar suas finanças antes de buscar repactuação;
  • Apresentar proposta realista e proporcional;
  • Buscar assistência jurídica para formular o plano de pagamento.

Para advogados:

  • Orientar os clientes quanto às responsabilidades em audiência;
  • Esclarecer que o ônus da proposta é do consumidor;
  • Defender a presença efetiva do credor como elemento suficiente para afastar sanções.

Resumo para destaque no SGE

O que acontece se o banco comparecer à audiência, mas não fizer proposta?
Segundo o STJ, nenhuma sanção deve ser aplicada, desde que o credor esteja presente na audiência. A obrigação de apresentar plano de pagamento é do consumidor.


Considerações finais

A decisão da Terceira Turma do STJ sobre a repactuação de dívida por superendividamento é um marco importante na consolidação dos direitos e deveres de consumidores e credores.

Ao reconhecer que a simples presença na audiência já cumpre a exigência legal, o STJ evita abusos interpretativos e reforça o papel do consumidor como protagonista na busca pela sua reestruturação financeira.

É fundamental que, em tempos de crescente superendividamento, os mecanismos de conciliação sejam aplicados com equilíbrio, respeitando os direitos de ambas as partes e priorizando soluções justas e viáveis para todos.

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