A citação por edital no exterior é uma prática processual permitida em casos específicos, especialmente quando o endereço do réu é desconhecido ou incerto. No entanto, para que essa modalidade seja válida, é necessário observar uma série de critérios legais, como a tentativa de localização por meio de cooperação jurídica internacional, através da expedição de uma carta rogatória. Este tema ganhou relevância recente após uma decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que analisou a questão e trouxe orientações importantes sobre a legalidade da citação por edital para réus que residem fora do Brasil.
Neste artigo, vamos explorar detalhadamente o entendimento do STJ sobre o tema, explicar os mecanismos de cooperação jurídica internacional, os limites legais para a citação por edital no exterior, e quais os requisitos que devem ser cumpridos para que essa modalidade de citação seja válida.
O que é citação por edital?
A citação por edital é uma das formas de comunicação oficial para que o réu seja informado de uma ação judicial em que figura como parte. Essa modalidade é utilizada quando todas as tentativas de localização do réu se mostram infrutíferas, ou quando ele se encontra em lugar incerto ou desconhecido. Nesse caso, a citação é realizada de forma pública, por meio de edital publicado em jornal oficial e/ou em meios de comunicação designados pelo juiz, permitindo que o réu tenha ciência do processo e exerça seu direito de defesa.
No contexto de um réu que reside no exterior, a citação por edital no exterior segue a mesma premissa: ocorre quando, mesmo após tentativas de localização e notificação por outros meios, o réu não é encontrado em um endereço conhecido.
O que é uma carta rogatória?
A carta rogatória é um instrumento de cooperação jurídica internacional, utilizado para a prática de atos processuais fora do território nacional, como citação, intimação, notificação, ou a colheita de provas. Quando o réu reside em outro país, a expedição de uma carta rogatória pode ser solicitada para que as autoridades estrangeiras atuem no cumprimento de uma determinação judicial brasileira.
No entanto, para que essa cooperação ocorra, o país estrangeiro deve manter tratados de cooperação jurídica com o Brasil, além de respeitar suas próprias normas e soberania. A expedição de uma carta rogatória é um procedimento formal, e muitas vezes demorado, mas é um mecanismo eficiente para assegurar que o réu seja citado no exterior, conforme os ditames legais.
O caso analisado pelo STJ: citação por edital no exterior é válida quando o endereço é incerto
O caso julgado pela Terceira Turma do STJ (REsp 2.145.294) tratou da legalidade da citação por edital no exterior de uma empresa que alegou não ter sido citada adequadamente em um processo. A empresa argumentou que sua representante legal residia nos Estados Unidos, e que o correto seria a expedição de uma carta rogatória para citá-la formalmente, e não a utilização da citação por edital.
No entanto, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) havia decidido que a citação por edital era válida, uma vez que todas as tentativas de localização da empresa e de sua representante foram fracassadas. O TJSC mencionou que, apesar de ter sido informada a possível residência da representante nos Estados Unidos, a falta de um endereço específico inviabilizou a expedição da carta rogatória.
A empresa recorrente alegou que as autoridades brasileiras deveriam ter solicitado cooperação à alfândega norte-americana para localizar o endereço da representante, e só após a resposta negativa dessa solicitação, a citação por edital seria permitida.
Contudo, o STJ decidiu que, nos casos em que o endereço do réu no exterior é incerto ou desconhecido, a citação por edital é uma medida legítima. A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou que a carta rogatória é, de fato, um meio de citação quando o endereço do réu no exterior é conhecido. Porém, quando o réu se encontra em local ignorado ou incerto, a citação por edital é válida, conforme o artigo 256, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC).
Requisitos para a citação por edital no exterior
A decisão do STJ esclarece que a citação por edital no exterior pode ocorrer em situações onde o réu está em lugar desconhecido ou incerto, desde que se esgotem outras tentativas de localizá-lo. O artigo 256 do CPC define que a citação por edital é válida nos seguintes casos:
- Réu em lugar ignorado ou incerto: Quando o endereço do réu é desconhecido, e todas as tentativas de localização, por meio de diligências, não obtiveram sucesso.
- Local inacessível: Se o réu estiver em um país que se recusa a cumprir a carta rogatória, ou em uma localidade em que a comunicação judicial seja impossível por barreiras legais ou físicas.
- Outros meios esgotados: A citação por edital só pode ser utilizada após o esgotamento de todas as alternativas possíveis de localização do réu, incluindo a tentativa de cooperação internacional.
A relatora do caso ainda pontuou que, embora o artigo 256, parágrafo 1º, do CPC mencione que um país será considerado inacessível caso recuse o cumprimento da carta rogatória, isso não significa que a negativa da carta seja um pré-requisito obrigatório para a citação por edital no exterior. A ministra enfatizou que a incerteza quanto ao endereço é suficiente para justificar o uso da citação por edital.
A cooperação jurídica internacional e seus desafios
A cooperação jurídica internacional, embora seja uma ferramenta essencial para garantir que atos processuais sejam cumpridos no exterior, nem sempre é simples ou rápida. A expedição de cartas rogatórias depende de diversos fatores, como a existência de acordos bilaterais, a disposição do país estrangeiro em colaborar e o cumprimento de exigências burocráticas.
Além disso, quando o endereço do réu no exterior não é conhecido com precisão, torna-se inviável solicitar a cooperação internacional, o que torna necessária a utilização de outros métodos, como a citação por edital no exterior.
Comparação entre citação por edital e carta rogatória
Aspecto | Citação por Edital no Exterior | Carta Rogatória |
---|---|---|
Quando é utilizada | Quando o réu está em lugar incerto ou ignorado | Quando o réu tem endereço conhecido no exterior |
Requisitos | Incerteza quanto ao endereço | Cooperação jurídica entre países |
Vantagens | Rapidez e simplicidade | Maior garantia de comunicação ao réu |
Desvantagens | Risco de o réu não tomar ciência do processo | Processo mais demorado e burocrático |
Considerações finais
A decisão da Terceira Turma do STJ traz um importante esclarecimento sobre a utilização da citação por edital no exterior, especialmente em casos onde o endereço do réu é desconhecido ou incerto. Embora a cooperação jurídica internacional seja uma ferramenta valiosa para garantir o cumprimento de atos processuais em outros países, a citação por edital pode ser utilizada como alternativa válida quando a localização do réu não é precisa.
Essa decisão fortalece o entendimento de que, embora a citação pessoal deva ser buscada sempre que possível, as exceções previstas no Código de Processo Civil devem ser observadas para garantir a continuidade do processo e evitar a paralisação de ações judiciais por falta de citação.
Ao aplicar a citação por edital no exterior, é fundamental que o Poder Judiciário assegure que todas as tentativas de localização pessoal foram esgotadas, respeitando os direitos processuais das partes e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.