A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reiterou o entendimento sobre a impossibilidade de vender uma vaga de garagem penhorada a terceiros, caso a convenção condominial não permita. Mesmo em situações de alienação judicial por hasta pública, a vaga de garagem penhorada não pode ser adquirida por pessoas que não sejam condôminos, exceto se houver autorização expressa na convenção do condomínio.
Este entendimento foi reafirmado em um julgamento recente, no qual a Quarta Turma do STJ analisou um recurso relacionado à penhora de uma vaga de garagem com matrícula própria. O pedido foi feito por uma instituição financeira em uma ação de execução extrajudicial contra uma devedora.
A devedora, proprietária da vaga de garagem, argumentou que a convenção do condomínio onde residia proibia a venda ou locação da vaga de garagem a terceiros, que não fossem condôminos. Com base nisso, ela sustentou que a vaga de garagem deveria ser considerada impenhorável, já que sua venda para terceiros estaria vetada pela convenção.
Decisões anteriores: TJSC e juízo de primeiro grau
Antes de o caso chegar ao STJ, tanto o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) quanto o juízo de primeiro grau já haviam se manifestado sobre o tema. Nessas instâncias, foi decidido que a proibição imposta pela convenção condominial não seria aplicável em caso de alienação judicial. No entanto, ambas as decisões reconheceram o direito de preferência dos condôminos para igualar a oferta feita por qualquer interessado externo. Isso permitia que, caso algum terceiro fizesse uma proposta, os condôminos teriam a oportunidade de cobrir a oferta e adquirir a vaga de garagem.
Entendimento do STJ: prevalência da convenção condominial
O STJ, por meio do voto do ministro relator Antonio Carlos Ferreira, reafirmou a jurisprudência consolidada no tribunal sobre a questão, destacando que a penhora de vagas de garagem com matrícula própria é permitida. Essa possibilidade está prevista na Súmula 449 do STJ, que dispõe sobre a penhorabilidade de vagas de garagem associadas a imóveis de família.
Contudo, o relator destacou que a alienação da vaga de garagem a pessoas estranhas ao condomínio depende de autorização expressa da convenção condominial, conforme estipulado pelo artigo 1.331, parágrafo 1º, do Código Civil de 2002. O ministro Antonio Carlos Ferreira enfatizou que o objetivo dessa regra é garantir maior segurança aos moradores e preservar o controle sobre o acesso às dependências internas do condomínio.
Ele explicou que, ao restringir a venda e locação das vagas de garagem apenas aos condôminos, a convenção condominial contribui para um ambiente mais organizado e seguro, reduzindo o risco de ocorrências como furtos, vandalismos ou invasões. Essa limitação também proporciona uma sensação de segurança e acolhimento aos moradores, que podem confiar que apenas indivíduos autorizados terão acesso ao estacionamento do condomínio.
Venda de vaga de garagem em hasta pública: restrição aos condôminos
Diante desse entendimento, o ministro relator concluiu que a decisão do TJSC, que permitiu a participação de terceiros na hasta pública, violou o artigo 1.331, parágrafo 1º, do Código Civil. Mesmo em caso de alienação judicial, a venda da vaga de garagem deve ser restrita aos condôminos, em respeito à convenção condominial.
O ministro Antonio Carlos Ferreira ressaltou que, embora a penhora de vagas de garagem seja válida, a venda dessas vagas a não condôminos não pode ser autorizada sem o consentimento expresso dos outros moradores do condomínio. Esse entendimento protege os interesses da coletividade dos condôminos, que têm o direito de regular o uso e a alienação dos espaços comuns do condomínio, como as vagas de garagem.
Portanto, no julgamento do REsp 2.095.402, o STJ reformou a decisão do TJSC e determinou que a alienação judicial da vaga de garagem penhorada fosse limitada aos condôminos do edifício residencial, respeitando a convenção condominial.
Segurança e organização no uso das vagas de garagem
Um dos principais fundamentos para a decisão do STJ está relacionado à segurança e à organização do condomínio. Ao vedar a alienação de vagas de garagem a terceiros, o Código Civil, por meio do artigo 1.331, busca evitar que pessoas alheias ao condomínio passem a circular com frequência nas áreas comuns do edifício, como o estacionamento.
A circulação de estranhos no condomínio pode aumentar a probabilidade de furtos e outros tipos de incidentes. Por isso, a restrição prevista no Código Civil e reforçada pela convenção condominial é uma forma de proteger os moradores, garantindo que apenas aqueles que residem ou trabalham no local tenham acesso regular às dependências internas, como as vagas de garagem.
Além da segurança, o controle do uso das vagas de garagem também contribui para a organização interna do condomínio. Permitir a venda ou locação irrestrita dessas vagas poderia gerar conflitos entre os condôminos e causar desordem na administração do espaço, uma vez que a presença de indivíduos não residentes poderia comprometer o bem-estar da coletividade.
A preferência dos condôminos em caso de alienação judicial
Outro ponto importante destacado pelo STJ é o direito de preferência dos condôminos na aquisição da vaga de garagem penhorada. Em caso de execução judicial, ainda que a vaga possa ser alienada, os condôminos têm prioridade para cobrir qualquer proposta feita por terceiros. Isso significa que, se algum morador do condomínio estiver interessado na vaga de garagem, ele poderá exercer seu direito de preferência e adquirir a vaga pelo mesmo valor oferecido pelo eventual comprador externo.
Essa prerrogativa dos condôminos reforça a ideia de que o uso e a propriedade das vagas de garagem devem ser mantidos dentro da comunidade condominial, em respeito à convenção e aos interesses dos moradores.
Considerações finais
A decisão do STJ no REsp 2.095.402 reafirma a importância da convenção condominial como instrumento de regulação do uso e da alienação das vagas de garagem nos condomínios. Embora a penhora de vagas de garagem seja permitida, conforme a Súmula 449 do STJ, a venda dessas vagas a não condôminos continua sujeita à autorização expressa da convenção condominial.
Essa restrição visa proteger os interesses da coletividade, garantindo a segurança, a organização e o bem-estar dos moradores. Além disso, a decisão assegura aos condôminos o direito de preferência na aquisição das vagas de garagem em caso de alienação judicial, permitindo que o controle sobre esses espaços seja mantido dentro do condomínio.
Leia o acórdão completo no REsp 2.095.402.