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Filho como interino em lugar do pai falecido é nepotismo póstumo

Limites e garantias nos cartórios extrajudiciais: STJ

O nepotismo póstumo em cartórios é um tema jurídico relevante e ainda pouco discutido fora do meio notarial e registral. O termo se refere à prática de nomear, como responsável interino por um cartório, um parente próximo do titular falecido.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o RMS 63.160, firmou que essa prática viola o princípio constitucional da moralidade e contraria o Provimento 77/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça, que veda a designação de interinos com parentesco ou relação conjugal com o antigo delegatário.

Essa decisão não só reafirma a vedação do nepotismo póstumo, como também dialoga com outros temas correlatos abordados na mesma sessão da Primeira Turma: a remoção em concursos de cartórios sem exigência de titulação específica e a responsabilidade tributária do titular por débitos fiscais.


O que é nepotismo póstumo em cartórios?

O nepotismo póstumo ocorre quando, após o falecimento do titular de uma serventia extrajudicial, um parente próximo (como cônjuge, filho ou irmão) é nomeado interino para responder pelo expediente.

O Provimento 77/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça é claro:

É vedada a designação de interino com vínculo de parentesco, por consanguinidade ou afinidade, com o antigo delegatário.

A intenção é evitar que a serventia permaneça sob domínio familiar sem concurso público, preservando a impessoalidade e a moralidade administrativa.


O caso julgado pelo STJ (RMS 63.160)

No processo, um filho havia sido nomeado interino no lugar do pai, titular de cartório em Campos dos Goytacazes (RJ), após o falecimento deste. A nomeação foi anulada pela Corregedoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, com base no Provimento 77/2018.

O interessado impetrou mandado de segurança buscando reverter a decisão. O TJ-RJ manteve a anulação, e o caso chegou ao STJ.

O relator, ministro Sérgio Kukina, destacou que:

  • A vedação existe para evitar hereditariedade na titularidade de cartórios.
  • A restrição deve ser aplicada em conjunto com o critério da antiguidade previsto na lei.
  • A medida está “em desenganada sintonia com o princípio constitucional da moralidade”.

Assim, a Primeira Turma manteve a anulação da nomeação, caracterizando a situação como nepotismo póstumo.


Concursos de remoção: titulação específica não é exigida

Ainda na mesma sessão, no RMS 50.366, o STJ analisou um caso de concurso de remoção no Rio Grande do Sul. A questão era se, para concorrer à remoção, o candidato precisaria ter na origem a mesma titulação específica da serventia de destino.

A candidata alegou que apenas titulares da mesma natureza poderiam concorrer. Contudo, o ministro Benedito Gonçalves, relator, negou o pedido, esclarecendo que:

  • A exigência de especialização do serviço se aplica apenas ao ingresso, não à remoção.
  • Para remoção, basta ter mais de dois anos de titularidade na serventia anterior, seja notarial ou registral.
  • Serventias com acumulação de atividades permitem que notários e registradores concorram igualmente.

Responsabilidade tributária do titular do cartório

No AREsp 1.858.938, o STJ reafirmou que o titular do cartório responde pessoalmente por débitos fiscais, já que a serventia não tem personalidade jurídica.

No caso, um substituto que atuou como titular durante afastamento do titular original foi cobrado por ISS não recolhido. Sua defesa argumentou que a responsabilidade deveria recair sobre o Estado ou sobre o “patrimônio do cartório”.

O ministro Gurgel de Faria rejeitou o recurso, citando precedentes que confirmam a responsabilidade direta do titular ou do substituto pelo recolhimento de tributos.


Quadro resumo das três decisões

TemaProcessoPonto centralResultado
Nepotismo póstumoRMS 63.160Vedação à nomeação de parentes como interinosNomeação anulada
Concurso de remoçãoRMS 50.366Dispensa de titulação específica para remoçãoPedido negado
Responsabilidade tributáriaAREsp 1.858.938Titular responde por débitos fiscaisRecurso negado

Impactos práticos dessas decisões

Para candidatos a cartórios

  • Não é possível assumir interinamente a serventia do parente falecido.
  • Em concursos de remoção, a titulação específica não é requisito, ampliando oportunidades.

Para titulares e substitutos

  • A responsabilidade fiscal é direta e pessoal. O não pagamento de tributos pode gerar execução contra o patrimônio próprio.

Para a administração pública

  • As corregedorias estaduais devem observar estritamente o Provimento 77/2018.
  • Processos de remoção devem seguir critérios de antiguidade e tempo de titularidade, não de especialização.

Perguntas frequentes sobre nepotismo póstumo em cartórios

1. Posso ser interino se meu pai faleceu e eu já trabalhava no cartório?
Não, o parentesco é impeditivo, mesmo que você já atuasse na serventia.

2. Existe exceção à regra?
Não, a vedação é absoluta no Provimento 77/2018.

3. E se não houver outro substituto?
A corregedoria nomeará outro interino sem parentesco.

4. A regra vale só para filhos?
Não, vale para qualquer parente por consanguinidade ou afinidade.


Conclusão

O julgamento do nepotismo póstumo em cartórios pelo STJ reforça a moralidade e a impessoalidade no exercício das funções notariais e registrais. A decisão impede que serventias continuem sob controle familiar após a morte do titular, garantindo que a sucessão se dê via concurso público.

Somadas às definições sobre concursos de remoção e responsabilidade tributária, essas decisões trazem segurança jurídica e uniformidade na interpretação das normas cartorárias no Brasil.

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