A Quinta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG) proferiu decisão importante no campo da execução trabalhista: reconheceu a possibilidade de penhora de herança para pagamento de dívida trabalhista, mesmo antes da partilha definitiva dos bens. O entendimento permite que credores trabalhistas busquem satisfazer seus créditos por meio da fração hereditária do devedor, resguardando os direitos dos demais herdeiros.
Entenda o Caso: Penhora de Imóveis Herdados para Quitar Dívida Trabalhista
No caso analisado, o credor ingressou com agravo de petição buscando a penhora da parte da herança que caberia ao devedor, no âmbito de um processo de execução trabalhista. A mãe do executado havia falecido, deixando cinco imóveis como parte do espólio. O exequente pretendia a penhora da cota-parte pertencente ao devedor, respeitando o quinhão dos outros herdeiros.
Inicialmente, a 7ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte extinguiu a execução, amparada no artigo 924, inciso I, do Código de Processo Civil (CPC), sob o argumento de inexistência de bens penhoráveis. Contudo, ao julgar o agravo, a relatora, juíza convocada Adriana Campos de Souza Freire Pimenta, reformou a decisão, reconhecendo o direito do credor à penhora de herança para pagamento de dívida trabalhista.
A Herança como Bem Penhorável: Transmissão Automática aos Herdeiros
A decisão baseou-se no artigo 1.784 do Código Civil, que estabelece que a herança é transmitida automaticamente aos herdeiros no momento do falecimento. Ou seja, mesmo antes da conclusão do inventário, os herdeiros já têm direito à fração ideal da herança. Assim, os bens herdados podem responder pelas dívidas do herdeiro devedor, conforme prevê o artigo 789 do CPC.
Portanto, ao ser transmitida a herança, surge a possibilidade de se realizar a penhora diretamente:
- No rosto dos autos do inventário, isto é, anotando-se a penhora no próprio processo que tramita no juízo de sucessões;
- Na matrícula dos imóveis, por meio de averbações, caso ainda não tenha sido iniciado o inventário.
Essa interpretação garante que o credor possa satisfazer seu crédito sem prejudicar os direitos dos outros herdeiros e respeitando o limite da parte do devedor.
O Que é a Penhora no Rosto dos Autos?
A penhora no rosto dos autos é um mecanismo jurídico que permite a constrição de valores que o devedor tem direito a receber em outro processo judicial. Prevista no artigo 860 do CPC, ela é especialmente útil em casos em que o devedor figura como parte em inventários, ações indenizatórias, execuções ou partilhas.
Ao penhorar no rosto dos autos do inventário, o credor impede que o valor correspondente ao quinhão do devedor seja entregue a ele sem antes saldar a dívida trabalhista. A penhora é averbada no processo de inventário e, ao final, a parte da herança do devedor poderá ser destinada ao pagamento da dívida.
Direitos Hereditários e a Dívida Trabalhista: Como Funciona?
A decisão do TRT-MG também esclareceu que, quando o inventário ainda não foi aberto, é possível registrar averbações de penhora diretamente na matrícula dos imóveis. Nesse caso, o cartório de registro de imóveis recebe o mandado judicial de averbação da penhora dos direitos hereditários.
Essa averbação protege o credor, pois impede que o bem seja alienado ou transmitido livremente, resguardando a parte que cabe ao devedor para a quitação do débito trabalhista.
Essa possibilidade decorre da regra geral de responsabilidade patrimonial prevista no artigo 789 do CPC, segundo a qual o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações.
Assim, a penhora de herança para pagamento de dívida trabalhista é legítima, observando sempre:
- A fração correspondente ao devedor;
- A proteção dos demais herdeiros, que não podem ser prejudicados.
O Impacto da Decisão para Credores Trabalhistas
A decisão do TRT-MG representa um avanço significativo para a efetividade da execução trabalhista, que muitas vezes enfrenta dificuldades pela ausência de bens penhoráveis em nome dos devedores. Em muitos casos, devedores se beneficiam da demora na tramitação de inventários para evitar a satisfação dos créditos.
Com esse precedente, os credores passam a ter mais uma ferramenta jurídica para garantir a efetividade da execução, alcançando o patrimônio que, embora ainda formalmente em inventário, já pertence de forma ideal ao devedor.
Além disso, a decisão reafirma o princípio da proteção do crédito trabalhista, que possui natureza alimentar e, portanto, tem preferência em relação a outros créditos.
Requisitos para a Penhora de Direitos Hereditários
Para que seja possível a penhora de herança para pagamento de dívida trabalhista, alguns requisitos devem ser observados:
- Falecimento do titular dos bens: Com a morte, a herança é transmitida automaticamente aos herdeiros;
- Identificação da parte ideal: Deve ser possível individualizar a fração que pertence ao devedor, respeitando os quinhões dos demais herdeiros;
- Resguardo dos direitos dos demais herdeiros: Apenas a parte do devedor pode ser penhorada;
- Inexistência de bem de família: Caso o bem herdado seja protegido pela impenhorabilidade do bem de família (Lei 8.009/90), a penhora não será possível;
- Observância do devido processo legal: O credor deve formular o pedido de penhora nos autos da execução trabalhista e, se necessário, no juízo de sucessões.
Precedentes e Jurisprudência
O entendimento adotado pela Quinta Turma do TRT-MG já vem sendo seguido por outros tribunais do trabalho. Há jurisprudência consolidada no sentido de que:
- Os direitos hereditários podem ser penhorados em ações de execução;
- A penhora pode se dar tanto no inventário em curso quanto mediante averbação na matrícula dos imóveis;
- A dívida trabalhista, por seu caráter alimentar, justifica a adoção de medidas eficazes para a sua satisfação.
Essa linha de decisão confere maior efetividade às execuções e concretiza o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, assegurando ao trabalhador o recebimento de seus créditos.
Conclusão
A recente decisão do TRT-MG reafirma que a penhora de herança para pagamento de dívida trabalhista é plenamente possível e legítima. Essa medida assegura que o credor trabalhista possa alcançar o patrimônio do devedor, mesmo que este esteja formalmente vinculado a um inventário ainda não concluído.
O reconhecimento da penhora dos direitos hereditários fortalece o processo de execução e impede práticas de blindagem patrimonial que poderiam frustrar o pagamento de verbas alimentares.
Essa jurisprudência serve de alerta tanto para os credores quanto para os devedores, reforçando a necessidade de respeito às obrigações trabalhistas, sob pena de terem seu patrimônio herdado comprometido.
Fonte: TRT-3 (Processo PJe: 0010571-63.2024.5.03.0007)