A Secretaria da Fazenda e Planejamento de São Paulo anunciou mudanças significativas nas regras de controle e restituição de créditos de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). A decisão foi publicada em 19 de agosto de 2025, poucos dias após a Operação Ícaro, deflagrada para investigar um esquema de corrupção envolvendo auditores fiscais e grandes varejistas.
O novo regulamento busca aumentar a segurança, transparência e conformidade no processo de restituição e transferência de créditos tributários. Entretanto, ao mesmo tempo em que amplia os mecanismos de fiscalização, as novas regras podem trazer maior complexidade burocrática, especialmente para pequenos varejistas.
Neste artigo, vamos detalhar o que muda, quais os impactos para contribuintes e empresas, além de analisar como a reforma tributária poderá transformar esse cenário nos próximos anos.
📖 O que mudou nas regras de restituição de créditos de ICMS?
A principal alteração foi a revogação do Decreto nº 67.853/2023, que havia instituído a chamada “apropriação acelerada” de créditos. Esse modelo permitia maior agilidade na utilização dos valores a compensar.
Com as novas normas, todos os pedidos de restituição passam a exigir:
- Auditoria fiscal completa;
- Cruzamento automatizado de dados;
- Rastreabilidade ampliada das operações;
- Integração futura com plataformas digitais de controle.
Na prática, isso significa que cada solicitação de ressarcimento deverá ser examinada em detalhe, com verificação documental e análise cruzada de informações fiscais e contábeis.
⚖️ O contexto: Operação Ícaro e combate a fraudes
A Operação Ícaro, deflagrada em 12 de agosto de 2025, investigou pagamento de propina entre auditores fiscais e redes varejistas. O esquema envolvia a liberação irregular de créditos de ICMS, causando prejuízos aos cofres públicos.
Diante desse cenário, o governo paulista endureceu os controles, buscando evitar:
- Apropriações indevidas de créditos;
- Compensações fraudulentas;
- Esquemas de corrupção na homologação de restituições.
Segundo a Secretaria da Fazenda, a medida garante mais transparência e rastreabilidade, reduzindo brechas para fraudes.
📊 Impactos para contribuintes e varejistas
Pequeno varejo: o elo mais fragilizado
Os pequenos varejistas tendem a ser os mais afetados pelas mudanças. No regime de ICMS-ST (substituição tributária), a indústria ou distribuidor paga o imposto de forma antecipada, com base em uma margem de valor agregado presumida.
Se o produto for vendido por valor inferior ao estimado, o varejista tem direito à restituição da diferença. Porém, agora será necessário apresentar documentação detalhada e aguardar análise mais rigorosa, o que pode gerar:
- Maior tempo de espera para receber os créditos;
- Necessidade de investir em sistemas de controle;
- Custos extras com assessoria contábil ou jurídica.
Grandes redes varejistas
Apesar de também enfrentarem maior burocracia, as grandes redes possuem estrutura de TI e compliance tributário que facilita o cumprimento das novas exigências. Para elas, o impacto tende a ser administrativo, e não tanto operacional.
💡 Exemplos práticos de restituição
Para ilustrar, vejamos um caso hipotético:
- Base presumida para recolhimento de ICMS-ST: R$ 150.
- Valor efetivo da venda: R$ 100.
- Nesse cenário, o varejista recolheu ICMS sobre R$ 150, mas deveria ter recolhido sobre R$ 100.
Resultado: existe um crédito a ser restituído.
Antes, esse valor poderia ser apropriado de forma mais célere. Agora, o pedido passa por auditoria completa, o que pode atrasar o processo em meses.
📌 Segmentos mais impactados
Os setores mais expostos às novas regras são aqueles em que o ICMS-ST é amplamente aplicado, como:
- Farmacêutico (remédios e cosméticos);
- Bebidas;
- Autopeças;
- Produtos de higiene e limpeza;
- Alimentos embalados.
Além disso, empresas que atuam com exportações ou em operações com isenção/redução de base de cálculo também acumulam créditos de ICMS que dependem de restituição.
⏳ O fator tempo: burocracia e lentidão
Um dos maiores problemas apontados por empresários é o prazo para restituição. Em média, o processo já levava de 6 a 8 meses para homologação. Agora, com a obrigatoriedade de auditoria detalhada, os prazos podem ser ainda maiores.
Isso afeta diretamente o fluxo de caixa das empresas, principalmente as de menor porte, que dependem da restituição para manter equilíbrio financeiro.
🔮 A reforma tributária e o fim da substituição tributária
Com a reforma tributária prevista para 2026, o regime de substituição tributária será gradualmente substituído pelo modelo de split payment. Nesse sistema, o imposto é recolhido diretamente no momento da transação comercial.
Benefícios esperados:
- Devolução automática de créditos, centralizada pelo Comitê Gestor do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços);
- Redução de fraudes;
- Simplificação do processo.
No entanto, especialistas alertam que os prazos para restituição — previstos entre 180 e 360 dias — ainda podem representar um desafio.
📈 Estratégias para empresas enfrentarem as mudanças
Diante das novas regras, empresas e varejistas podem adotar algumas medidas:
- Investir em tecnologia fiscal para cruzamento de dados e rastreabilidade.
- Revisar processos internos de apuração e documentação de créditos.
- Capacitar equipes contábeis para lidar com as exigências da auditoria.
- Buscar assessoria jurídica especializada para contestar eventuais glosas ou atrasos indevidos.
- Planejar o fluxo de caixa, considerando prazos maiores para restituição.
📌 Conclusão
As novas regras de restituição de créditos de ICMS em São Paulo representam um movimento claro do governo paulista em direção a maior rigidez e transparência.
Se, por um lado, a medida fortalece a fiscalização e reduz riscos de fraude após a Operação Ícaro, por outro, aumenta a burocracia e os prazos de restituição, especialmente para o pequeno varejo.
No horizonte, a reforma tributária promete simplificar o processo, eliminando a substituição tributária e trazendo o split payment. Contudo, até que isso se concretize, empresas precisarão adaptar seus processos e se preparar para um ambiente mais rígido de controle fiscal.